domingo, 28 de março de 2010

A Utopia, de Thomas More


A Ilha da Utopia, imaginada pelo renascentista Thomas More e descrita nas palavras de seu personagem Rafael Hitlodeu em A Utopia, é uma das mais fortes contradições ao espírito protestante que habitava as mentes dos filósofos do século XVI. O sistema comunal de governo exercido pelos utopianos inverte os valores e virtudes da época, demonstrando um modo de vida em que a procura do prazer da alma e do corpo, a volúpia, são as virtudes que devem direcionar as atitudes do homem.
Em A Utopia, Thomas More aponta o modo como os utopianos menosprezam os valores materiais, sendo que os mesmos usam o ouro, símbolo da luxúria, para forjarem cadeias e correntes para os escravos. Os utopianos definem a virtude da seguinte forma, “viver segundo a natureza”, pois “Deus criando o homem, não lhe deu outro destino”. A convivência utopiana é harmônica, não há atritos sociais, todos trabalham e compartilham o seu fruto. Suas vestes são simples e iguais a todos.
A forma como o autor descreve as cidades da Ilha da Utopia faz com que o leitor imagine a mais pura perfeição do convívio social. Existem regras que determinam tal harmonia, como o respeito irrestrito às leis das cidades e estas são raramente violadas e quando isto acontece, são severamente punidos aqueles que o fazem.
O desenvolvimento da inteligência e a contemplação da verdade são valores sustentados pelos utopianos. O trabalho é comum a todos, mas o estudo das ciências também é concedido a todos, sendo que os operários podem fazê-lo em horários de folga e os que demonstram maior vocação têm o direito, concedido pelos seus governantes, de dedicar-se em tempo integral à atividade intelectual.
A sociedade comunal apresentada em A Utopia assemelha-se ao comunismo primitivo, onde cada qual recebe aquilo que necessita, nada mais. O prazer dos sentidos é exaltado e o prazer do corpo se resume aos prazeres fisiológicos, a saúde mental e física.
O que fica claro na obra de Thomas More é a sua inversão de valores e a sua crítica aos valores da sociedade em sua época, como a acumulação, a valorização do supérfluo, a luxúria e glorificação da imagem. Também fica claro a tentativa do autor de resgatar os valores cristãos


que a igreja, a todo custo, buscava impor aos seus fiéis que já não a estimavam tanto diante das promessas do protestantismo.
Thomas More descreve uma sociedade mais justa e humana onde não há explorados, senão os escravos, mas estes são moralmente admitidos. A Utopia é o primeiro passo na construção de um pensamento alternativo de sociedade que fundamenta o pensamento pré-cursor da revolução francesa. Thomas More idealiza, através de sua mudança romântica, a utopia reafirmada por outros posteriores pensadores: a utopia da reformulação de sociedade, sem porém apresentar a fórmula e sim, o resultado imaginado.
A sociedade ideal apresentada por Thomas More é composta de homens com virtudes cristãs, como o desprezo aos bens materiais, à poupança, e enaltecendo os valores do espírito, e a prosperidade eterna aos bons homens e virtuosos.
A Utopia é uma obra que marca um período onde a igreja católica já não comporta as necessidades dos seus fiéis e perde espaço para a então ascendente religião protestante. Thomas More cumpre o papel, como renascentista, de desenvolver uma nova esperança aos fiéis cristãos resgatando os valores e virtudes necessários à permanência do catolicismo como força política.
A Ilha da Utopia serve de fundamento aos filósofos posteriores a Thomas More que tentarão formular uma teoria consistente para a concretização desta “utopia” de se criar uma sociedade comunal, justa e sem exploradores e explorados, sendo que alguns seguem essa linha “utópica” e outros irão mais a fundo, procurando uma ciência para alcancá-la, como é o caso de Marx.

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