domingo, 28 de março de 2010

Movimentos Sociais e Educação Popular


A construção da cidadania, e o seu conseqüente engajamento político é um processo que se verifica em alguns aspectos do desenvolvimento dos estudos sobre movimentos sociais e educação popular que se entrelaçam em pesquisas na área das ciências sociais a partir da década de 70 do século passado.
Esse aspecto é ressaltado por Maria da Glória Gohn, em seu livro intitulado: Movimentos Sociais e Educação. No exame dos princípios e métodos da educação popular encontramos várias manifestações que se fazem presentes, concretamente, nos movimentos sociais populares dos anos 80. A autora também ressalta que quando a produção sobre os movimentos sociais cresce, ocorre o inverso com a educação popular, ela declina.
O desenvolvimento autônomo da literatura sobre educação popular e movimento social popular urbano passa por uma transformação, “a educação popular propriamente dita inverte a sua correlação, da educação fundamental para o fundamental da educação”, e nesse ponto é exemplo o MEB – Movimento de Educação de Base – e os programas do Sistema Paulo Freire.
Após a sua fase embrionária, durante a década de 50, onde houve uma grande produção intelectual a nível nacional, (Octávio Ianni, Antônio Cândido, Maria Isaura Pereira de Queirós...) a década de 60 sofreu grande influência da sociologia francesa. Na década de 70, devido à conjuntura do momento, as políticas de educação popular se voltavam para a formulação de estímulos à energia da sociedade civil, a saber os oprimidos, a fala do povo, a construção da consciência e participação política.
Na área da educação, os programas “alternativos” da educação popular se transformam em trabalhos coletivos de equipes junto a populações pobres de áreas específicas. Em contraposição às políticas de assistencialismo desenvolvidas pelo Estado, os movimentos sociais progressistas pressupunham que “as populações mais marginalizadas e mais pobres se apropriem de um novo saber-instrumento; um saber que pode ser usado diretamente na realização dos objetivos sociais desta camada”, tendo como referencial o Sistema Paulo Freire.
Os movimentos populares são uma extensão das práticas educativas desenvolvidas pelos programas de educação popular, nos movimentos sociais a educação é auto-construída no desenvolver do processo e o educativo surge de diferentes fontes.
Mas também é necessário fazer uma autocrítica quanto à postura de alguns movimentos sociais, que “se distanciam de seu objetivo maior em função de querelas secundárias, na defesa de seus redutos e propostas político-eleitorais, deslumbrados pelo poder local”. Diante dessa problemática a autora aponta para a necessidade de se considerar um “antigo ensinamento, tão ignorado: a questão não é lutar pelo poder estatal mas construir uma nova sociedade, reorganizar a sociedade de forma diferente, não mais em cima de utopia de um coletivo abstrato, organizado pelas palavras de ordem de minorias com sede de poder, ainda que um poder mais democrático, organizar a resistência a partir dos indivíduos, de suas singularidades, de seus desejos e aspirações... a partir destes pressupostos é que deveremos construir novas práticas coletivas”.
Após a leitura do texto de Maria da Glória Gohn, percebe-se que a essência de um movimento social está na sua base, na sua construção, ou seja, na educação popular, no desenvolvimento da consciência cidadã e crítica. A cidadania plena só pode ser desenvolvida no movimento social, onde a educação popular é o elemento fundamental da construção da identidade e da auto-afirmação, e esse processo é autêntico, uno, sem fórmulas doutrinárias, apenas a união da ação consciente e pedagógica pode fazer dos indivíduos elementos coesos dentro de um coletivo operador e transformador da sua história.

Globalização Hegemônica e Contra-Hegemonia Global




As grandes transformações ocorridas no mapa geopolítico mundial no decorrer da Guerra Fria (1945-1989) e acentuadas após a dissolução do bloco hegemônico socialista liderado pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, URSS, trazem para o campo das ciências sociais um novo objeto, complexo, em formação e carente de conceitos.
Esse processo de expansão mundial do capital denominado globalização tem toda a sua teoria e prática regida pelos princípios do neoliberalismo, a lei do livre mercado, a redefinição do papel do Estado e a reorganização da divisão internacional do trabalho.
Dentro dessa complexa estruturação global de poder em andamento, surge uma problemática que desafia teóricos e cientistas políticos: a identidade do novo cidadão global, qual a sua característica essencial e o seu papel dentro desse contexto, tanto do ponto de vista conformista e, principalmente, conflitante.
Os laços que unem o cidadão ao Estado já não são os mesmos de tempos atrás, ou como se projeta no campo do ideal contratualista. O Estado-nação, após duas décadas de intensas “injunções” ou ingerências internacionais tornou-se uma província da sociedade global. A emergência de estruturas mundiais de poder, organizações multilaterais como o Fundo Monetário Internacional, FMI e a Organização Mundial do Comércio, OMC e as corporações internacionais formam o grande bloco onipotente mundial a ditar as regras de mercado, regras do capital, sem levar em conta a emergência também de uma sociedade civil global que se serve cada vez mais das estruturas de comunicação e organização existentes.
Essa sociedade civil vê suas aspirações se distanciarem das práticas políticas do Estado nacional, estando este cada vez mais vulnerável às “injunções externas” e subalterno às orientações, ou imposições das organizações multilaterais. IANNI (1999) esclarece bem esse descompasso entre o Estado e a sociedade civil em seu artigo A política mudou de lugar: “...a sociedade civil está predominantemente determinada pelo jogo das forças sociais ‘internas’, o Estado parece estar crescentemente determinado pelo jogo das forças sociais que operam em escala transnacional”.
Pode-se dizer que o que está em causa é a construção da “hegemonia conflitante”. Com a vigência da hegemonia mundial do capital, liderada pela potência estadunidense, abrindo fronteiras territoriais, econômicas, culturais, lingüísticas, religiosas para a implantação de sua ideologia consumista e alienante a identidade deixa de ser apenas local ou nacional, mas também se mundializa.
Faz-se necessário a estruturação de um contra-ponto, a nível global, a esse modelo unilateral, agressivo e prepotente, unindo várias correntes de pensamento divergentes entre si, mas que têm algo em comum, o posicionamento contrário a essa nova ordem do caos. “Estão em causa, pois, as condições de construção e realização da hegemonia, seja das classes e grupos sociais subalternos, seja de outros e novos arranjos compreendendo subalternos e dominantes que desafiem as diretrizes dos blocos de poder organizados e atuantes nos moldes do neoliberalismo. Assim, forças sociais importantes da sociedade civil defrontam-se com obstáculos às vezes intransponíveis para traduzir-se em governo, governabilidade, dirigência ou hegemonia. Sim, a construção de hegemonias conflitantes, alternativas ou sucessivas, pode ser um requisito essencial da dialética sociedade civil e Estado. E sem nenhuma hegemonia fica difícil pensar não só em soberania nacional, mas também em democracia, mesmo que apenas política”.
As classes dominantes dirigentes dessa revolução tecnológica têm na mídia o seu “intelectual orgânico” reprodutor dos seus valores e dentre esses, o consumismo adquire uma nova significação. Impregnado pela mídia, por todos os meios de comunicação, o consumismo adquire valor de cidadania, de prazer humano, “devido ao modo pelo qual a publicidade induz ao consumo faz com que indivíduos, coletividades e multidões, consciente ou inconscientemente, elejam o consumismo como um exercício efetivo de participação, inserção social ou mesmo cidadania”. O cartão de crédito assume a posição de status quo, principal documento de identidade, de credibilidade, o cidadão globalizado é reconhecido pelo seu poderio econômico. Com a ausência do Estado forte e com a lei do livre mercado a pleno desenvolvimento, a qualidade de cidadão se dá àquele que possuir esse documento.
A nova ordem mundial, com seu desenvolvimento sem precedentes na história gera também um movimento, uma “hegemonia conflitante” com potencial na mesma proporção, mas a formação dessa alternativa esbarra em teorias e ideologias conflitantes entre si. É necessária uma leitura aprofundada do contexto e da correlação de forças entre o histórico conflito capital/trabalho e buscar a consolidação de um consenso, de um movimento mundial contra o neoliberalismo envolvendo toda a sociedade numa frente ampla, empresários nacionalistas, trabalhadores, governos progressistas e patriotas, movimentos sociais e excluídos em geral, pois o momento é difícil e crucial para a humanidade.
Em linhas gerais, pode-se notar que esse movimento existe e é crescente. Essa “hegemonia conflitante” se expande devido à própria contradição desse modelo excludente neoliberal, a palavra agora é “alternativa”, comunicação alternativa, alimentação alternativa, valores alternativos... buscando unir o mundo nesse desenvolvimento dialético da história.
Como afirma Ianni, o cenário em que emergem as manifestações sociais, econômicas, políticas e culturais pode ser chamado de neosocialismo, e esse é o palco onde a política está sendo reterritorializada. O exercício pleno da cidadania alternativa, não a cidadania do capital, é a busca da articulação do regional com o global, a afirmação do nacional e a consciência do todo, da mundialização da identidade e da luta de classes que se define num novo patamar da história, sendo necessária uma compreensão do velho que se definha e o novo que germina.

Sociologia Urbana e o Direito à Cidade


A ciência analítica que tem por objeto a cidade é uma ciência que ainda encontra-se no esboço. Assim Henri Lefèbvre, em sua obra O direito à cidade inicia suas considerações sobre o desenvolvimento das cidades e das relações sociais estabelecidas no contexto histórico urbanístico. A reflexão sobre a cidade exige uma contextualização histórica e visa o conhecimento e a reconstituição das capacidades integrativas do urbano, bem como as condições de participação prática .
O direito à cidade refere-se ao direito à vida urbana, à habitação, à dignidade, significa pensar a cidade como espaço de usufruto do cotidiano . Considerando o pensamento de Lefèbvre, ultrapassa o conjunto de necessidades físicas, significando um conjunto de necessidades “antropológicas socialmente elaboradas”. Nesse sentido o direito à cidade abarca as necessidades físicas e psicológicas do indivíduo, e o exercício desse direito requer uma estratégia orientada à sua garantia e à participação dos cidadãos na sua plena aplicação.
Considerando o modelo de sociedade em desenvolvimento, a sociedade do capital, a cidade, como outras formas sociais, adquire o caráter de mercadoria, tornando-se acessível aos possuidores dos meios econômicos para usufruí-la. A cidadania é algo ainda a ser conquistado, ou reconstruído pelos agentes da sociedade, pelo conjunto de excluídos da sua própria cidadania.
Existem hoje mais de 300 “cidades-regiões” no mundo com população superior a 1 milhão de habitantes, destas, 20 com mais de 10 milhões. Estratégias de planejamento e políticas urbanas tradicionais nessas regiões tornam-se problemáticas . A partir destas constatações a ciência da cidade se vê desafiada por novos questionamentos, desafiada a elaborar uma conceituação nova e a formular uma prática condizente com o movimento histórico que tem configurado essa nova realidade.
O quadro atual da correlação de forças não favorece o trabalho, o sistema social do capital alcança a sua fase imperialista, de dominação global. As ideologias que marcaram o século XX foram sucumbidas e as alternativas de sociedade ficam restringidas à hegemonia. Duas ideologias predominantes cruzam essas questões, a neoliberal e a social-liberal , sendo a segunda uma aproximação da social-democracia da linha neoliberal. Muitos pensadores concordam com Fukuiama, a história teve o seu fim.
O pesquisador do espaço urbano Henri Lefevre aponta para a superação do velho humanismo e para a direção dos esforços analíticos no sentido de uma nova práxis, de um novo homem, o homem da sociedade urbana. Lefebvre a importância da formulação de uma nova estratégia urbana, que significa a formulação de um hierarquia de variáveis da ações políticas, sem considerar as estratégias existentes e os conhecimentos adquiridos. Essa busca visa o conhecimento necessário para a “planificação do crescimento e para o domínio do desenvolvimento”.
Apenas os grupos organizados podem realizar as reformas necessárias. Tais reformas segundo Lefebvre, têm caráter não de recolocação da ordem, mas revolucionário, no sentido de solução dos problemas urbanos. Para tal, é necessário a integração das força sociais nesse projeto, nessa estratégia. Dois pontos práticos levantados pelo autor são a formulação de: Um programa político de reforma urbana e projetos urbanísticos bem desenvolvidos.
O programa político, de caráter singular e paradoxal, deverá ser proposto aos partidos políticos, preferencialmente àqueles que procuram representar a classe operária, essencial à proposta transformadora, aos partidos políticos de esquerda. Os projetos urbanísticos bem desenvolvidos deverão conter proposições a curto prazo, a prazo médio e a longo prazo, constituído uma estratégia urbana propriamente dita.
A ciência da cidade deve considerar o processo histórico e impulsiona-lo. O direito à cidade configura-se como direito inalienável do indivíduo, haja vista o que representa o espaço urbano no desenvolvimento do sistema capitalista imperialista. O direito à cidade significa o direito à vida, o direito ao usufruto dos bens urbanos pelos cidadãos, resta agora impulsionar o processo de conscientização sobre a cidadania, sobre a razão das desigualdades de classes e a sua superação.

Manifesto do Partido Comunista - Resenha


I
Burgueses e proletários

Burgueses e Proletários. Entende-se por burgueses, a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social e empregam trabalho assalariado; e por proletários, a classe dos trabalhadores assalariados modernos, que não tendo meios de produção próprios, são obrigados a vender sua força de trabalho para sobreviver.
A história de todas as sociedades que já existiram até hoje é a história de luta de classes, opressores e oprimidos sempre estiveram em constante oposição uns aos outros.
Surgida das ruínas da sociedade feudal, a moderna sociedade burguesa não eliminou os antagonismos de classe, apenas estabeleceu novas condições de opressão. Dos servos da Idade Média nasceram os moradores dos burgos das primeiras cidades; deles saíram os primeiros elementos da burguesia.
O modo de exploração feudal não mais atendia às necessidades que aumentavam com o crescimento dos novos mercados; a divisão do trabalho entre as diversas corporações desapareceu diante da divisão do trabalho dentro de cada oficina. O lugar da manufatura foi ocupado pela grande indústria moderna e essa criou o mercado mundial sedento de avanço econômico-político.
A burguesia moderna é o produto de um longo processo de desenvolvimento, de uma série de revoluções nos modos de produção e troca. Cada uma dessas etapa foi acompanhada por um progresso político correspondente. A burguesia, com o estabelecimento da grande indústria e do mercado mundial, conquistou finalmente o domínio político exclusivo no Estado representativo moderno. O poder político do Estado moderno nada mais é do que um comitê para administrar os negócios comuns de toda a classe burguesa.
A burguesia desempenhou um papel histórico revolucionário, onde quer que ela tenha conquistado o poder. Ela transformou atividades consideradas de veneração em atividades assalariadas, o médico, o poeta, o jurista, o padre, o homem da ciência; com o rápido aperfeiçoamento dos instrumentos de produção, a burguesia mudou radicalmente os variegados laços feudais, no lugar da exploração mascarada por ilusões políticas e religiosas colocou a exploração aberta.
A necessidade de mercados cada vez mais extensos para seus produtos impele a burguesia para todo o globo terrestre, submetendo o campo ao domínio da cidade, os povos camponeses aos povos burgueses; aglomerou a população; centralizou o poder nas mãos do Estado, como forma de melhor administrar os conflitos.
A classe burguesa se apropriou dos meios de produção, do poder político e concentrou a propriedade num domínio jamais visto na história. Subjugando forças da natureza, unificando as nações, as línguas, a moeda, fazendo com que a classe explorada começasse a identificar os seus exploradores, a classe burguesa se viu em paridade de desenvolvimento com a classe proletária.
Os “operários modernos” são a base formada e moldada pela própria burguesia para a sua derrubada. Os operários começam a formar coalizões contra os burgueses, reúnem-se para defender os seus salários. De tempos em tempos, os operários triunfam, mas é um triunfo efêmero. O verdadeiro resultado de suas lutas não é o resultado imediato, mas a união cada vez mais ampla dos operários, quando aí se formam os partidos políticos.
Aproveitando das constantes disputas internas da burguesia e da sua luta contínua contra a aristocracia, a classe operária organizada se farta dos elementos de sua própria educação fornecidas pela burguesia. De todas as classes que hoje se opõem à burguesia, apenas o proletariado é uma classe verdadeiramente revolucionária.
Os proletários só podem se apoderar das forças produtivas sociais suprimindo todo o modo de apropriação já existente até hoje. Os proletários nada têm de seu para salvaguardar, o seu movimento é independente da maioria no interesse da imensa maioria.
Esboçando as fases mais gerais do desenvolvimento do proletariado, seguimos a guerra civil mais ou menos oculta dentro da sociedade atual, até o momento em que ela explode numa revolução violenta e aberta.
A burguesia produz acima de tudo, seus próprios coveiros. Seu declínio e a vitória do proletariado são igualmente inevitáveis.





II

Proletários e comunistas

Os comunistas não constituem um partido à parte, oposto aos outros partidos operários.
O objetivo imediato dos comunistas é o mesmo que o de todos os demais partidos proletários: constituição do proletariado em classe, derrubada da dominação burguesa, conquista do poder político pelo proletariado.
Sua teoria se resume na abolição da propriedade privada burguesa, por entender que essa cria capital e só pode aumentar havendo a exploração do trabalho assalariado. A burguesia chama a supressão dessa situação de supressão da personalidade e da liberdade. E com razão! Trata-se realmente da supressão da personalidade, da independência e da liberdade do burguês.
A propriedade privada se resume a uma pequena parcela da sociedade e os comunistas e proletários, já despossuídos, querem realmente abolir a propriedade existente, uma propriedade burguesa.
O comunismo não priva ninguém, de se apropriar dos produtos sociais; o que faz é eliminar o poder de subjugar o trabalho alheio por meio dessa apropriação.
A família burguesa, plenamente desenvolvida, desaparece com a derrubada do seu complemento.
Os comunistas procuram substituir a educação doméstica pela educação social, procuram transformar o seu caráter, arrancando a educação da influência da classe dominante.
Os operários não têm pátria. Na medida em que é abolida a exploração de um indivíduo por outro, é abolida também a exploração de uma nação por outra.
A revolução comunista é a ruptura mais radical com as relações tradicionais de propriedade, no curso de seu desenvolvimento ela rompe de maneira mais radical com as idéias tradicionais.
Medidas a serem tomadas em diferentes países mais avançados:
1. Expropriação da propriedade fundiária e emprego da renda da terra nas despesas do Estado.
2. Imposto fortemente progressivo.
3. Abolição do direito de herança.
4. Confisco da propriedade de todos os emigrado e rebeldes.
5. Monopólio de crédito nas mãos do Estado, através de um banco nacional.
6. Centralização dos meios de transporte nas mãos do Estado.
7. Multiplicação das fábricas nacionais; cultivo e melhoramento das terras segundo um plano comum.
8. Trabalho obrigatório e igual para todos.
9. Unificação dos serviços agrícolas e industriais.
10. Educação pública e gratuita para todas as crianças.

III
Literatura comunista e socialista

O socialismo reacionário tem em sua crítica e sua principal acusação contra a burguesia é a de que sob o seu regime se desenvolve uma classe que fará ir pelos ares toda a antiga organização social. O que mais reprovam a burguesia é o fate dessa Ter produzido um proletariado revolucionário.
O socialismo pequeno-burguês deseja estabelecer os antigos meios de produção e de troca, e com eles as antigas relações de propriedade. Em ambos os casos, tal socialismo é ao mesmo tempo reacionário e utópico.
O socialismo alemão é um socialismo influenciado pelo socialismo francês, portando um socialismo fora do contexto, ele esqueceu que a crítica francesa, da qual ele era um eco insípido, pressupunha a moderna sociedade burguesa com as correspondentes condições materiais de existência e uma apropriada constituição política- precisamente os pressupostos que, na Alemanha, ainda se tratava de conquistar.
O socialismo conservador ou burguês. Uma parte da burguesia deseja remediar os males sociais para garantir a existência da sociedade burguesa. Os burgueses socialistas querem a burguesia sem o proletariado.
Uma segunda forma desse socialismo procurava fazer a classe operária perder o gosto por todo movimento revolucionário, fazendo com que esse se dedicasse apenas a lutas por melhoramento administrativos que não mudam em nada as relações entre capital e trabalho assalariado.
O socialismo e o comunismo crítico-utópico não encontra em seus inventores condições materiais para a emancipação do proletariado, e opõem-se à procura de uma ciência social, de leis sociais, para criar tais condições. Querem melhorar a situação de todos os membros da sociedade, inclusive dos mais privilegiados, rejeitam toda a atuação política.
Tais proposições têm portanto um sentido puramente utópico e pouco a pouco caem na categoria dos socialistas reacionários ou conservadores, deles se distinguindo apenas pelo seu pedantismo, sua fé fanática e supersticiosa na eficácia milagrosa de sua ciência social.

IV
Posição dos comunistas diante dos diversos partidos de oposição

Os comunistas lutam para alcançar os interesses imediatos da classe operária, mas no movimento presente representa ao mesmo tempo o futuro do movimento. O partido em momento algum cessa de desenvolver nos operários uma consciência tão clara quanto possível do antagonismo hostil existente entre a burguesia e proletariado..
Em todas as partes os comunistas apoiam todo movimento revolucionário contra as condições sociais e políticas existentes, eles lutam e trabalham pelo entendimento entre os partidos democráticos de todos os países.
Os comunistas recusam-se a ocultar suas opiniões e suas intenções. Declaram que seus objetivos só podem ser alcançados com a derrubada violenta de toda a ordem social até aqui existente. Que as classes dominantes tremam diante de uma revolução comunista. Os proletários nada têm a perder nela a não ser suas cadeias. Têm um mundo a ganhar.
Proletários de todos os países, uni-vos!

Stálin e o Totalitarismo

por Diney Lenon de Paulo

      O presente paper consiste numa leitura sintetizada do texto Stalin e Stalinismo escrito pelo filósofo Claude Lefort, extraído do seu livro, A Invenção Democrática – Os limites da dominação totalitária.
      O trabalho feito nessa comunicação visa estabelecer os conceitos, a linha teórica e as características que Lefort designa ao dito modelo político stalinista, modelo totalitário. A delimitação das características do totalitarismo também será discutida a partir dos textos da cientista política Hannah Arendt, intelectual judia da linha democrático-liberal, exilada nos Estados Unidos no período da Guerra Fria e a leitura crítica ainda será acrescida do texto de Florestan Fernandes, Apontamentos Sobre a Teoria do Autoritarismo.
      O texto de Lefort faz parte do Colóquio acontecido em Genebra, no ano de 1980, organizado pela Faculdade de Letras e o Instituto dos Altos Estudos Internacionais, instituição da qual o autor é membro. O tema do Colóquio levou o nome do artigo que aqui se faz a leitura.
      A significação política que compreende o período histórico em que Stalin exerceu o poder na União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS, se destacando como Secretário Geral do Partido Comunista e assumindo o comando político da URSS após a morte de Lênin, ocorrida em 1924, até o seu falecimento em 1953. A política de Stalin não possui baliza, assim afirma Lefort, significando um exercício singular de poder.
      Utilizando do pensamento de Leon Trotski e Medvedev, Lefort faz uma crítica ao modelo político implantado por Stalin na URSS, modelo ao qual denomina uma “perversão” do marxismo sob a ótica de Marx, quando da implantação de uma casta burocrática na estrutura estatal (todos membros do partido) e também sob a ótica de Lênin, uma distância enorme nas suas práticas autoritárias e ambiciosas sob o aspecto pessoal. O gerador dessa prática monstruosa do aparelho estatal soviético sob o comando de Stalin é a vicissitude do real, é perda do caráter revolucionário para a mera conservação do poder conquistado. A luta política teria de se dar nas fileiras do partido, qualquer forma de expressão ou organização autônoma era reprimida por uma coerção forte e violenta, dando características totalitárias ao regime.
      Algumas contradições do processo revolucionário stalinista são levantadas por Lefort. O contexto do final da década de 1920, com as mudanças em andamento na China, a ascensão do nazismo na Alemanha, o fascismo na Espanha e na Itália, assim como o processo interno, conturbado pela drástica transformação imprimida pela revolução, a “coletivização” e a industrialização forçadas apontam para a estratégia totalitária stalinista. O processo histórico faz do stalinismo não mais uma conseqüência, mas um princípio. Medvedev julga que o stalinismo se define por seus excessos, por uma violência extraordinária, parasitária, mesmo sem negar que Marx não excluía a violência do processo revolucionário, porém afirma que havia os “excessos normais” e os “excessos excessivos”.
      O filósofo Claude Lefort ainda cita o pensador contra-marxista Soljenitsyn que, em sua concepção o stalinismo não chega a ser uma degeneração do marxismo, mas sim a sua face mais clara, o seu “conteúdo real”. A crítica vem ainda sobre a sua incoerência, enquanto marxista, fazendo de sua profissão de fé o materialismo histórico, ao afirmar que a luta dos bolcheviques era produto de idéias.
      Sem desacreditar o materialismo histórico, Lefort descreve o poder como condicionante do conjunto social em sua formação e encenação, chegando a citar até o processo “histórico natural”. A determinação-figuração da sociedade se dá pela imposição da política centralizada e personificada de Stalin, as formas de organização e manifestação dentro do regime passam pelo olhar dos seus dirigentes. A vigilância e a repressão são características do regime totalitário stalinista. O perigo da contra-revolução é levado às últimas conseqüências, Lefort aponta para as formas coercivas da política stalinista em relação aos opositores ao marxismo e aos marxistas não alinhados com o modelo instaurado. A intolerância às formas externas ao modelo soviético, segundo Lefort, passa por uma construção ideológica, outra característica totalitária.
      A tese desenvolvida por Lefort se define pelo poder estando alojado na representação. O estado representa o poder e se coloca acima da sociedade, assim como os homens do estado se colocam acima dos homens da sociedade. O Partido Comunista estabelece e organiza o sistema totalitário, nesse regime as características do indivíduo são suprimidas. “os sujeitos são constantemente submersos no coletivo, as determinações particulares da prática e do conhecimento aniquilados e a dimensão da própria realidade apagada enquanto reinam a certeza da visão socialista e o gozo narcisista da onipotência do corpo político”.
      No final do seu texto, Lefort cita Trótski quando este compara Luis XIV, os Papas de Roma a Stalin, ao stalinismo, ressaltando que aqueles governaram numa época de poder temporal, enquanto que o totalitarismo stalinista abarcou toda a economia. Recorrendo a um dos últimos escritos de Leon Trotski, Lefort afirma que Stalin bem poderia dizer: “O estado sou eu”.

      O texto de Claude Lefort nos leva a uma conclusão sobre o modelo político stalinista: um modelo totalitário, baseado na coerção, na estruturação burocrática, na repressão política, na ideologia, no terror, conseqüentemente num distanciamento do marxismo clássico de Karl Marx e até mesmo da teoria e prática de Lênin.
      A questão que se coloca é a seguinte: Até que ponto podemos concordar com Claude Lefort em sua classificação sobre o regime da URSS sob o comando de Josef Stalin? Quais são as características do totalitarismo? Em que contexto se constitui a política stalinista? Quem são os denunciadores do autoritarismo soviético? Em que ponto o regime stalinista é semelhante ao nazismo e ao fascismo, e à democracia burguesa?
      Essas colocações nos fazem remeter ao período histórico em que se encontra a “era stalinista”. Após a morte de Lênin, o grande líder político e teórico da Revolução Russa, Josef Stalin, 1º Secretário do Partido Comunista, com grande influência política, assume a liderança do estado soviético, vencendo seu adversário interno Leon Trótski.
      A década de 1920 foi uma década marcada por um enrijecimento político dos países europeus, seja na linha conservadora, seja na linha transformadora. O período pós 1ª Guerra é marcado por uma política de afirmação do estado nacional e recuperação econômica. A Alemanha vivia o auge do nazismo, Adolf Hitler assumia à frente do Partido Nacional Socialista Alemão, desde 1920, a ideologia nazista. Temendo a expansão do movimento socialista, nos moldes bolcheviques, a burguesia alemã se aliou ao partido de Hitler.
      Na Itália Benedito Mussolini, 1º Secretário do Partido Fascista, que se defrontava com os partidos Socialista e Popular, além da Central Geral dos Trabalhadores, assumia o poder em 1929, quando seu partido conseguiu uma grande vitória no parlamento e se tornou maioria. Mussolini se alia à igreja, na figura de Pio XI, e à nobreza, na figura de Emanuel III, instaurando o autoritarismo conservador.
      O quadro político daquele período era de constituição de estados fortes e comprometidos com ideologias profundas. Naquele momento, Stalin estava travando uma luta revolucionária e, ao mesmo tempo, contra-revolucionária, no sentido externo e interno. A manutenção do andamento das transformações na URSS demandava força e estratégia, leitura histórica de contexto.
      O conceito de stalinismo foi criado após a morte de Stalin. Sua origem deriva dos críticos aos regimes fortes, totalitários, deriva dos defensores da liberdade plena, dos princípios liberais. A classificação dos aspectos que formam a política totalitária também merece uma análise mais aprofundada para que possamos delimitar o conceito que nos coloca em questão.
      Estendendo a leitura do texto de Lefort, procurou-se apoio em Hannah Arendt visando uma compreensão da essência que define o totalitarismo. Para esta autora o totalitarismo se define por um regime político que possua os seguintes pontos: Ideologia – Partido Único – Terrorismo Policial Militar – Domínio dos meios de comunicação – Exército forte – Controle absoluto da economia. A cientista política afirma que a convergência dessas características só é possível no século XX e que apenas características isoladas são encontradas em regimes anteriores a essa época.
      Lefort atribui ao regime stalinista um modelo autoritário, centralizador e burocrático. Mas seria possível agir de forma diferente naquele momento? Para que possamos encontrar um apontamento para essa resposta, vale citar a obra de Florestan Fernandes intitulada Apontamentos sobre a Teoria do Autoritarismo , o autor, oferece uma visão histórica e contextualizada sobre o totalitarismo, sendo um dos maiores sociólogos marxistas brasileiros. Nesse texto elaborado na década de 1970, Florestan questiona a teoria do autoritarismo, coloca que nessa teoria não se busca o desmascaramento do estado burguês.
      O autoritarismo é a versão mais tirânica, sem máscaras, do estado burguês. Àqueles que criticam o regime totalitário soviético, Florestan Fernandes diz que a teoria verdadeiramente burguesa se dá antes da tomada do poder, assumindo o papel revolucionário, após a sua vitória ela se torna conservadora e utiliza todo o seu poder coercitivo para defendê-lo. O ideólogos da “sociedade perfeita”, os democratas liberais, definem a sociedade democrática como a possuidora do poder auto-responsável, que não é absoluto nem auto-regulável, onde a democracia é incompatível com a existência de castas. Mas o que se vê numa sociedade democrática é um regime de classes extremamente autoritário e reacionário sob qualquer ameaça da manutenção do status quo.
      A autodefesa da ordem é uma característica do sistema burguês, segundo Florestan Fernandes, o monopólio da dominação burguesa corresponde a um “monopólio do poder político estatal”. Quando necessário brota do regime burguês o “estado de exceção”. Florestan não explora a “neutralidade ética” e se coloca firmemente de um lado, se posiciona politicamente e centra suas análises na estrutura e na história.
      O capitalismo manietou o conflito social, procurou despojá-lo de sentido político. Assim Florestan define o cerco capitalista:
“O cerco capitalista é uma realidade externa e interna ao funcionamento do capitalismo no plano nacional e no plano mundial. Temos de compreender isso para entender melhor o fluxo da história e as alternativas da contra-revolução e da revolução”.
      O que difere as formas totalitárias de exercer o poder, sendo o conservantismo e a contra-revolução e o reformismo e a revolução são suas filosofias. O autoritarismo reformista ou revolucionário difere na sua duração e na sua própria história, culmina na liberdade, na igualdade e na extinção das classes. O autoritarismo burguês é conservador e reacionário.
      O regime totalitário stalinista se processa num determinado período histórico onde a bipolarização mundial de acentua entre o capitalismo e o socialismo. A constituição de regimes políticos fortes e comprometidos com ideologias revolucionárias e conservadoras é uma marca desse período histórico. Stalin implementou o regime socialista dentro da viabilidade histórica.
      A crítica às formas de governo totalitário provém de setores liberais que vêem no regime forte, centralizado, onde o estado assume papel preponderante, um entrave ao desenvolvimento dos princípios democráticos e liberais. A forma de manutenção da sociedade de classes, baseada na divisão do trabalho e na propriedade privada não é desmascarada pelos críticos liberais, que vêm no sistema democrático burguês o sistema ideal, perfeito. O que essa crítica não leva em consideração é a forma autoritária que o regime burguês faz sua política de manutenção da ordem dominante.

Debate conceitual acerca do Populismo


INTRODUÇÃO

Desde a década de 1930 as instituições políticas no Brasil vinham se transformando, processo decorrente de um aprofundamento da economia capitalista, numa vertente industrializante. Representa esse período uma revolução em todos os campos de leitura social. A compreensão desse processo histórico requer uma visão crítica de totalidade, onde se colocam as relações de produção num contexto de valorização da força de trabalho a nível mundial e que o Estado Nacional passa a estruturar a “colaboração” da classe trabalhadora para a sua afirmação na conjuntura internacional de disputa hegemônica.
Nesse período as correntes nacionalistas de direita ganhavam força na Europa frente ao descrédito das idéias liberais. O abalo da Crise Mundial de 1929 representou o sinal mais crítico e concreto de que outras ideologias eram necessárias. Ourtras formas de se pensar o desenvolvimento econômico das nações surgiam como alternativas mais seguras garantindo a intervenção do Estado, força legítima da Nação, no campo econômico e político.
O século XX pode ser considerado o século das “Guerras das Ideologias”. Inicia-se num contexto de grande disputa entre as nações imperialistas, vive as duas grandes guerras e uma guerra ainda maior, mais dura e longa, porém camuflada, a Guerra Fria. O impacto da Revolução de 1917 se processou de forma dialética entre o pensamento moderno e conservador europeu, gerando uma reação mais à direita, com o crescimento do fascismo e do nazismo de Benedito Mussolini e Adolf Hitler. A conjuntura favoreceu a expansão da ideologia do Estado forte, que assegurasse o desenvolvimento econômico dentro da ordem social e que através de uma propaganda de massas levasse a classe trabalhadora a um engajamento alienante na construção da pátria, na luta em defesa do governo, que se figurava como o representante da vontade política de todo o povo, de todas as classes, com um discurso voltado às classes trabalhadoras.
A formulação das idéias que se cristalizavam na Europa ainda se ligava às idéias de John Maynard Keynes, economista estadunidense que influenciou de forma considerável o pensamento econômico do século XX. Keynes teve sua teoria sobre a política de pleno emprego, com intervenção do Estado influenciando a reformulação do pensamento econômico americano pós-1929. A sua época se apresenta como um período de transformações profundas dentro de um processo de mundialização da economia, de divisão internacional do trabalho e disputa por hegemonia das nações.
A circulação de mercadorias e capital entre os países também movimenta idéias e pensamentos, estes se processam como prática em conjunturas e contextos diversos. Nesse sentido, a interpretação de fenômenos políticos, econômicos e sociais que abarcam o fenômeno do populismo latino-americano requer uma prévia contextualização histórica para o debate conceitual acerca do que venha a se definir por populismo. O que diversos autores, entre sociólogos e cientistas políticos, em sua maioria, buscam é teorizar, formular e aplicar tipologias para se analisar o populismo. O que se pretende neste ensaio é buscar apontar algumas interpretações sobre o fenômeno do populismo latino americano usando como objeto de análise, em especial, o Peronismo, populismo argentino mitificado e personificado na liderança de Juan Domingo Perón e o populismo de Getúlio Vargas no Brasil em períodos históricos próximos e com práticas semelhantes.

POPULISMO, A CONSTRUÇÃO DO CONCEITO

A discussão conceitual apresentada nesse ensaio se coloca no livro de Jorge Ferreira, organizador de O populismo e sua história . O texto publicado em 2001 reúne ensaios de pesquisadores argentinos sobre o peronismo, versão populista de Juan Domingo Perón. A conceituação de populismo não é apresentada como forma perfeita e bem definida, é colocada em diversos ângulos de análise. Alguns autores definem o fenômeno como uma patologia da estrutura social, fazendo uma leitura funcionalista. Outros interpretam o fenômeno como um processo histórico de fricção política e ação consciente das massas num movimento necessário à consolidação do capitalismo, essa leitura encontra coro entre os integrantes dos Partidos Comunista Argentino e Brasileiro, que esperavam com a consolidação desse modelo encontrar espaço fértil entre as contradições inerentes ao processo para a ascensão das idéias socialistas. O sociólogo argentino Gino Germani define o populismo como uma “etapa”, assim como os marxistas, mas no seu horizonte, essa prática política encaminharia a sociedade para um regime democrático forte e desenvolvido, essa era a concepção elaborada pelos pensadores da sociologia moderna.
Os críticos do conceito dissertam sobre a imprecisão do vocábulo. Seus modelos e tipologias são apresentados como superficiais quanto às particularidades nacionais, nem especificidades conjunturais.
Mackinnon e Petrone analisam o populismo e dividem as formas de interpretação deste fenômeno em dois grupos, os generalistas e os particularistas. Os dois pesquisadores buscam regularidades para evitar extremos da “particularização” e da “universalização”. Jorge Ferreira enfatiza que Mackinnon tende sua análise para uma visão de totalidade que envolve particularidades.
Nessa discussão sobre o método a ser empregado na análise sobre o populismo, Jorge Ferreira ainda cita Alberto Círia, que faz comparações entre as diferentes experiências, indicando ser esse método, o comparativo, o mais “frutífero” de análise .
Há uma variedade de fenômenos políticos caracterizados como populistas na América Latina entre o período de 1930-70. A delimitação do período populista nos países latino americanos é assim descrita por Jorge Ferreira: Populismo brasileiro, 1930-1964, 1930-1954, 1951-1954; o Populismo mexicano, que aqui serve de ilustração apenas, não sendo inserido na discussão, 1934-1940 e o Populismo argentino de 1946-1955. Como se pode notar, a delimitação de um espaço tempo para a análise do populismo latino americano proposta por Ferreira demonstra uma facilidade maior de compreensão e síntese do populismo argentino, que compreende o governo de Juan Domingo Perón, entre 1946 a 1955.
O populismo brasileiro constitui-se em momentos diferentes dentro de uma luta de afirmação que leva alguns pensadores a situarem o populismo varguista, uns entre 1930-1954, outros entre 1951-1954, outros ainda entre 1930-1964, período esse que considera o populismo pós-Vargas.
Façamos a análise do populismo de Perón na Argentina no período que compreende 1946-55.

A ARGENTINA INDUSTRIALIZANTE

Após a Crise Mundial de 1929 a produção industrial Argentina cresceu consideravelmente. A importação de produtos industrializados caiu de 25% do que representava a Produção Nacional, em 1925-30 para 6% em 1935-46. O número de operários duplicou no período que antecedeu a conquista do poder por Juan Domingo Perón. Na Secretaria do Trabalho e Previdência, Perón acompanhou o crescimento dos sindicatos e da sua representatividade política, estimulou a organização sindical. O Estado articulava e supervisionava os sindicatos que deveriam agir como base de sustentação da política desenvolvida pelo Estado, sempre em defesa do crescimento econômico (FERREIRA, p.145).
A estrutura montada pelo Estado argentino era centralizadora e unificante. O discurso usado pelo Estado “paternalista” era o da necessidade de haver apoio por parte dos trabalhadores ao Governo, além da confiança necessária por parte daqueles. Os Planos de Bem Estar Social, como a Fundação Eva Perón, se encarregavam de manter as camadas populares empolgadas com a política populista. O autor do texto ressalta que entre 1946 e 1949 o salário real dos trabalhadores cresce 53%, assim como a subordinação do sindicato ao Estado também aumentava. Com toda essa realidade de crescimento econômico e aplicação de medidas intervencionistas do estado no sentido de se estimular a produção nacional e o impulso e crescimento da classe média, há de se convir que, segundo Jorge Ferreira, os trabalhadores tinham motivos concretos para expressarem seu apoio a Perón .
Uma questão levantada por Miguel Murmis e Juan Carlos Portantiero é a desmistificação da idéia de uma classe trabalhadora conduzida pelo populismo, sem capacidade crítica de compreender o processo em que se inseria. Murmis e Portantiero descrevem a ação das classes trabalhadoras no processo como uma forma consciente de enfrentamento das contradições, de acordo com os seus interesses. Toda essa potencialidade sindical canalizada durante o fenômeno populista se deve, segundo a análise de Ricardo Sidicaro, a um ambiente favorável proporcionado pela política peronista, de estímulo à sindicalização .
Murmis e Portantiero ainda analisam a transcrição de uma fala de Perón e a de um líder sindicalista da época de seu governo feita por Daniel James para exemplificar sua defesa de que os sindicatos haviam adquirido força autônoma e impulsionaram as distintas iniciativas de apoio e defesa ativa do governo.

Se alguns pedem a liberdade, nós também a pedimos (...) Nem tampouco a liberdade de vender o país nem de explorar o povo trabalhador.
Perón.

A gente de 45 já estava cansada. Durante anos e anos haviam enganado sua fome com canções sobre a liberdade.
Mariano Tedesco – Líder Sindical

O apoio dos trabalhadores a Perón é aqui entendido como uma opção da própria classe em função de seus interesses materiais e subjetivos. Considerar o apoio das classes trabalhadores ao peronismo, ou populismo, como forma “inocente”, ou “ilusória” é um equívoco quando considerado o processo histórico do momento que marca uma série de grandes conquistas dos trabalhadores em nível de participação política.

O POPULISMO VARGUISTA

Sempre sensível às classes populares, Getúlio Vargas buscava conduzir o processo industrializante impulsionado pelo Estado de forma que os conflitos inerentes à política de consolidação do capitalismo nacional fossem assimilados pelo Estado. Francisco Weffort, em O Populismo na Política Brasileira, ressalta o caráter autoritário do governo paternalista e carismático dos líderes das massas que sucedem Vargas no período 1945-64. O que evidencia Francisco Weffort é o fato de o populismo ser uma prática de manipulação das massas, mas a manipulação nunca foi absoluta. Esse período é marcado por uma crise da oligarquia e das organizações liberais.
A política implementada por Vargas durante as décadas de 1930-40 impulsionou o crescimento econômico do Brasil. Nessa perspectiva de crescimento, a classe trabalhadora, enquanto força essencial à produção capitalista, se coloca como peso político considerável no processo.
A prática de Getúlio Vargas se assemelha em muitos aspectos à de Perón. O controle sobre os meios de comunicação de massa, o acompanhamento e orientação das organizações sindicais, a propagação dos ideários patriotas são instrumentos que Getúlio usou para a consolidação de uma imagem que lhe rende ainda hoje a caracterização do “Pai dos Pobres”. introduziu os direitos trabalhistas e impulsionou a modernização do país, “Um governo que se isola das massas populares está nutrindo, sem saber, o germe de sua própria destruição”.

O POPULISMO ENQUANTO DISCURSO IDEOLÓGICO

A abordagem do discurso ideológico perpetuado pelos governos populistas de Perón e Getúlio será tratada a partir dos documentos que eternizaram esse período. A Carta Testamento de Evita Perón e as últimas linhas escritas por Getúlio Vargas antes de seu suicídio contêm mensagens ideológicas que possibilitam um amplo campo para investigações sobre a constituição do mito do governante escravo de seu povo, cuja profissão de fé é defender os seus descamisados.
No dia 24 de agosto de 1954, Getúlio sob forte pressão dos militares “entreguistas”, como enfatiza Alain Rouquié, se suicida e deixa uma carta testamento que servirá de documento para inúmeras produções de conhecimento sobre o período populista brasileiro Vargas era um homem letrado, conhecedor profundo de direito e teoria política, suas últimas palavras o demonstraram. O então Presidente eleito democraticamente Vargas aponta para os espoliadores do povo como inimigos da nação e que lhe pressionavam naquele momento. .
O “Pai dos Pobres” se coloca como um escravo do povo, abnegado serviçal dos desejos do povo brasileiro, sua vida só existe razão em função do seu dever de proteger os seus descamisados e amá-los. Toda a propaganda ideológica veiculada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP criou a imagem do homem que amava o seu povo, que amava os pobres e em seu último discurso não poderia ser diferente. Vargas deixou em sua Carta Testamento o documento que contém a essência do seu populismo, a imagem do “bom pai”, do líder carismático, justo e soberano que, apesar de todas as dificuldades impostas pelos inimigos da nação, promoveu o bem estar dos trabalhadores, investiu na Nação “conciliou o conflito”.
Um outro documento que serve de análise sob esse prisma é a Carta Testamento de Maria Eva Duarte, Evita, ou a “Dama de la Esperanza”, ou “La abanderada de los humildes”. Em 1945 Perón havia se casado com Evita e uma imagem havia sendo trabalhada em torno da Primeira Dama. Durante sete anos Evita foi a companheira de Juan Domingo Perón, quando contraiu um câncer e veio a falecer. O vazio afetivo criado na vida de Perón foi incorporado pela campanha ideológica de mitificação e personificação da liderança política. Em seu testamento, Evita enaltece seu amor por Perón e pelo povo argentino, um discurso político-ideológico que contribuiu em muito para a mitificação da imagem dea grande mulher que daria a sua vida pelo seu grande amor, Perón, o “homem de grandes qualidade e que ama seu povo” .

Pido a todos los obreros, a todos los humildes, a todos los descamisados, a todas las mujeres, a todos los niños e a todos los ancianos de mi pátria que lo cuiden, lo acompañen a Perón como si fuese yo misma.
Evita Perón.

O que se evidencia na abordagem sobre o populismo é uma necessidade de se considerar as especificidades históricas que envolvem distintos processos de transformação na América Latina na maior parte do século XX. A conjuntura internacional de disputas hegemônicas e a necessidade de fortalecimento das economias nacionais determinam uma série de medidas de assimilação contenção das contradições do processo modernizante. O envolvimento das massas no âmbito político não é algo orquestrado, nem ingênuo, é uma configuração de forças que movimenta a história desses países.
A conduta dos governantes do período populista demonstra habilidade política diante dos problemas que emergiam. Num contexto internacional de disputas entre as ideologias, o populismo se configura como processo histórico inserido numa totalidade composta de particularidades históricas e conjunturais. Como afirma Norberto Bobbio, em seu Dicionário de Política, o conceito de populismo se apresenta de forma imprecisa, ambígua, seus modelos e tipologias são “confusos e contraditórios”. Muito ainda se tem de aprofundar sobre essa questão, mas pode-se criar um espaço propício à discussão do tema considerando a historicidade do processo.

A Utopia, de Thomas More


A Ilha da Utopia, imaginada pelo renascentista Thomas More e descrita nas palavras de seu personagem Rafael Hitlodeu em A Utopia, é uma das mais fortes contradições ao espírito protestante que habitava as mentes dos filósofos do século XVI. O sistema comunal de governo exercido pelos utopianos inverte os valores e virtudes da época, demonstrando um modo de vida em que a procura do prazer da alma e do corpo, a volúpia, são as virtudes que devem direcionar as atitudes do homem.
Em A Utopia, Thomas More aponta o modo como os utopianos menosprezam os valores materiais, sendo que os mesmos usam o ouro, símbolo da luxúria, para forjarem cadeias e correntes para os escravos. Os utopianos definem a virtude da seguinte forma, “viver segundo a natureza”, pois “Deus criando o homem, não lhe deu outro destino”. A convivência utopiana é harmônica, não há atritos sociais, todos trabalham e compartilham o seu fruto. Suas vestes são simples e iguais a todos.
A forma como o autor descreve as cidades da Ilha da Utopia faz com que o leitor imagine a mais pura perfeição do convívio social. Existem regras que determinam tal harmonia, como o respeito irrestrito às leis das cidades e estas são raramente violadas e quando isto acontece, são severamente punidos aqueles que o fazem.
O desenvolvimento da inteligência e a contemplação da verdade são valores sustentados pelos utopianos. O trabalho é comum a todos, mas o estudo das ciências também é concedido a todos, sendo que os operários podem fazê-lo em horários de folga e os que demonstram maior vocação têm o direito, concedido pelos seus governantes, de dedicar-se em tempo integral à atividade intelectual.
A sociedade comunal apresentada em A Utopia assemelha-se ao comunismo primitivo, onde cada qual recebe aquilo que necessita, nada mais. O prazer dos sentidos é exaltado e o prazer do corpo se resume aos prazeres fisiológicos, a saúde mental e física.
O que fica claro na obra de Thomas More é a sua inversão de valores e a sua crítica aos valores da sociedade em sua época, como a acumulação, a valorização do supérfluo, a luxúria e glorificação da imagem. Também fica claro a tentativa do autor de resgatar os valores cristãos


que a igreja, a todo custo, buscava impor aos seus fiéis que já não a estimavam tanto diante das promessas do protestantismo.
Thomas More descreve uma sociedade mais justa e humana onde não há explorados, senão os escravos, mas estes são moralmente admitidos. A Utopia é o primeiro passo na construção de um pensamento alternativo de sociedade que fundamenta o pensamento pré-cursor da revolução francesa. Thomas More idealiza, através de sua mudança romântica, a utopia reafirmada por outros posteriores pensadores: a utopia da reformulação de sociedade, sem porém apresentar a fórmula e sim, o resultado imaginado.
A sociedade ideal apresentada por Thomas More é composta de homens com virtudes cristãs, como o desprezo aos bens materiais, à poupança, e enaltecendo os valores do espírito, e a prosperidade eterna aos bons homens e virtuosos.
A Utopia é uma obra que marca um período onde a igreja católica já não comporta as necessidades dos seus fiéis e perde espaço para a então ascendente religião protestante. Thomas More cumpre o papel, como renascentista, de desenvolver uma nova esperança aos fiéis cristãos resgatando os valores e virtudes necessários à permanência do catolicismo como força política.
A Ilha da Utopia serve de fundamento aos filósofos posteriores a Thomas More que tentarão formular uma teoria consistente para a concretização desta “utopia” de se criar uma sociedade comunal, justa e sem exploradores e explorados, sendo que alguns seguem essa linha “utópica” e outros irão mais a fundo, procurando uma ciência para alcancá-la, como é o caso de Marx.

MLST e a afronta à ordem. Sobre os Sem Terra, o Congresso e a nossa "esquerda".


O Movimento de Libertação dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, MLST é um movimento pequeno, mas com muita força. Criado a partir de uma dissidência de integrantes do MST, na década de 1990, atua essencialmente nos estados de Pernambuco, Minas Gerais e São Paulo.

Há no país hoje, segundo o pesquisador Bernardo Mançano, 73 organizações de trabalhadores rurais. E o MLST é uma delas. O histórico de atuação do movimento é de ações pacíficas. Quem conhece a realidade no campo sabe que os movimentos não provocam a violência (ou na maioria absoluta das vezes), apesar de viverem constantemente sob o signo de vítimas dela.
A ação do dia 6 de junho é mais uma ação moldada pela grande mídia, os grandes meios de comunicação reacionários que forjam nas consciências uma idéia contrária à ação do povo do MLST têm seus objetivos ao atacar qualquer movimento do povo organizado. Era de se esperar e sempre o será, enquanto vivermos a vergonha da “desumanização” dessas pessoas frente ao luxo de uma minoria de privilegiados, muitos membros de quadrilhas organizadas (a maior delas é a que esteve acuada nesse dia, a quadrilha do congresso). Do conforto dos lares, a classe média condena os atos de “violência” dos que a mídia conseguiu convencionar, classificar como “baderneiros” (hoje, qualquer ação que atente contra ordem é classificada como “baderna”). O povão, entorpecido, se divide, uns condenam a violência, outros com um certo ar “anárquico” se deliciam de ver o pau comendo! Mas o triste é ver nossos “camaradas” do congresso revelando sua posição reacionária diante da ameaça à ordem.
A mídia capitalista se delicia e faz seu papel, joga a sociedade contra o movimento. Os tucanos atacam o governo e dizem que isso é coisa do PT, os latifundiários do PFL pedem exército, manutenção da ordem, a ordem capitalista, mas o que decepciona, deixa triste realmente, é ver o “camarada” Aldo Rebelo condenar o “vandalismo”, termo muito usado pelas forças e mídias reacionárias! A verdade é que, nenhum camarada congressista levantou defesa, ou mesmo, justificação da ação do povo do MLST, pelo contrário, o Partido Comunista do Brasil, PCdoB, partido governista, ainda publicou uma nota condenando a ação dos trabalhadores.
Este artigo está sendo escrito num momento de fortes reflexões sobre o papel que um partido político declaradamente marxista deve ter na nossa sociedade. Vendo a ação dos quase 500 trabalhadores do movimento, que ao serem barrados pela segurança do congresso resolveram exercer o seu direito de entrar na “casa do povo”, como afirmou Rebelo, foram presos e mais uma vez, se criminalizou o movimento social. A pauta do movimento era extensa, tinham uma carta a ser entregue aos deputados, entre as reivindicações o fim da lei que impede a reforma agrária em terras ocupadas. Mas como sabemos, o congresso é um lugar “íntegro”, de justiça, de aplicação das leis e deve manter a ordem!
Que ordem? Que ordem foi rompida? Qual a dimensão da violência dos militantes (diante de uma ação violenta da segurança que tentava impedir o acesso destes “cidadãos”) e a dimensão da violência que sofrem no cotidiano? Pensemos um pouco.
Fazendeiros com dívidas milionárias para com o povo brasileiro, haja vista que devem essa fortuna ao Banco do Brasil fazem manifestações, usam maquinários e fecham estradas exigindo o perdão de dívidas, a renegociação, são atendidos no congresso, pois são financiadores, “companheiros de classe” de muitos congressistas. Usas reivindicação são ouvidas, pensadas, e são muitas vezes, na maioria das vezes, atendidas. O tratamento da segurança para com esses manifestantes é de “senhor, por favor...”. O tratamento da mídia é diferenciado, muito claro sua posição de compromisso com o latifúndio e com a ordem capitalista.
Integrantes de um movimento social, que radicalizam, são baderneiros, condenados pela mídia, pelos direitistas e agora, pela esquerda: “Calma companheiros, não é bem assim”, ou, com todas as palavras do Presidente da “Casa do Povo”:

“O Partido Comunista do Brasil, que apóia e sempre apoiou a luta dos trabalhadores rurais por suas justas bandeiras, vem a público repudiar os atos de violência e vandalismo perpetrados, na tarde de hoje, na Câmara dos Deputados. Atos dessa natureza --inconseqüentes e irresponsáveis-- se voltam contra o próprio interesse dos trabalhadores e de seus movimentos. Ao mesmo tempo, o PCdoB apresenta sua solidariedade e respaldo ao presidente da Câmara dos Deputados, Aldo Rebelo, por suas ações em defesa do Poder Legislativo.”

Eis a questão: O que é o Poder Legislativo? A serviço de quem ele trabalha? Ele foi atacado por quem? Pensando nas classes socais, digo: A defesa do Congresso seria uma atitude benéfica para qual classe? O “ataque” ao Congresso é benéfico para qual classe? Pensemos...
O que incomoda é o termo vandalismo na nota de um partido, dito, marxista-leninista. Procuro entender a tal “estratégia eleitoral”, a “correlação de forças desfavorável”, a necessidade de se ocupar o estado. Procuro fazer a crítica, processa-la, mas não consigo me desatrelar da concepção marxista de que o comunista é comunista em todas ações e declarações, deve ser claro, não mentir para o povo, não subestimar o conhecimento do povo, não negar seu objetivo maior, a derrubada violenta da sociedade capitalista. Me dói ouvir um comunista dizer isso, classificar uma ação de um movimento social, mesmo que espontânea (o que pessoalmente não acredito), como ato de “vandalismo”, com a mesma conotação dada por Antônio Carlos Magalhães, por exemplo.
Nessa reflexão sobre o MLST, que já é antiga sobre os movimentos sociais e sua atuação política, há também uma intenção clara de se pensar os partidos de esquerda do país. Ter de publicar uma nota como essa é, digamos, “o preço que se paga” por aderir ao sistema eleitoral burguês e ter como prioridade de ação política a manutenção no poder, levando a declarações e ações, no mínimo, reacionárias.
O movimento, que em abril do ano passado ocupou o Ministério da Fazenda, busca sim visibilidade e não pode ser condenado por isso. O movimento composto por trabalhadores rurais não pode ser criminalizado. Um comunista não pode fazer uma leitura simples, sem considerar a estrutura social, sem fazer a devida crítica. Quiçá houvesse outra manifestação hoje, uma no Rio Grande do Sul, onde o governo gaúcho tem dado amplo apoio à monocultura do eucalipto, ao deserto verde, outra manifestação na sede do governo de São Paulo, que não avança nas regiões do Pontal do Paranapenema.
Quiçá houvesse mais manifestações, ocupações, mais confronto com a ordem estabelecida! Assim estaríamos avançados no movimento comunista, mas um comunista não pode esconder seus objetivos. Aprendi pela dor, na vida política, que ou se é santa, ou se é puta, pois não dá para acender uma vela ao santo e outra ao diabo. Todo apoio ao MLST, todo apoio ao povo do MLST, ao povo do campo, às dezenas de organizações camponesas dessa América! Venceremos! Para encerrar, citarei um pensamento, uma “máxima” do marxismo, nas palavras do próprio:

“Os comunistas recusam-se a ocultar suas opiniões e suas intenções. Declaram abertamente que seus objetivos só podem ser alcançados com a derrubada violenta de toda ordem social existente.”
Violência, isso, violência, aquilo... Democracia não se faz assim.... Tem de ser dentro da lei... blá...blá...blá... Chega!! Chega de hipocrisia! Chega de atacar os pobres quando estes se levantam. Devem reagir com violência sim, reagir à violência cotidiana, a falta de direitos!! A classe média critica aqueles que comentem ações “não-civilizadas”, mas que santa hipocrisia, criticar a cidadania daqueles que não têm direitos! A ação do MLST é, em verdade, uma reação à condição que vivem milhões de brasileiros sem terra, que são tratados como criminosos por serem corajosos e desafiarem a ordem! Ordem da exclusão!

Movimentos Sociais na América Latina, Bolívia e luta antiimperialista


Introdução

Este artigo tem por objetivo fazer uma breve leitura sobre o desenvolvimento dos movimentos sociais na América Latina nos últimos anos, em especial na Bolívia, alvo de especulação midiática dos últimos dias em função da nacionalização das reservas e indústrias de hidrocarburetos.
Não se pretende aqui fazer uma análise da questão que envolve o “gás da Bolívia”, mas sim dos movimentos sociais que impulsionam o processo político daquele país e sua ligação com o movimento latino-americano de integração regional. Será tratada aqui a questão do avanço qualitativo dos movimentos sociais da América Latina, sua função dialética, de pressão sobre os governos nacionais e a disputa de interesses das camadas populares e de empresas transnacionais.
Nesse sentido, depois de delimitado o problema a ser criticado, o primeiro passo para se analisar uma realidade política é conhecer sua realidade histórica. Para tanto, as Ciências Sociais se colocam como importantes instrumentos de análise que se completam e se unem sob várias concepções de mundo, de método e de linhas de pensamento. Esse artigo se coloca como uma leitura sociológica. Os aspectos considerados serão os políticos, logicamente dentro de um processo histórico.
Nessa introdução à compreensão da realidade boliviana, dos movimentos sociais daquele país, da grande mobilização social que toma conta do continente latino-americano e do processo político de profundas transformações de nosso tempo, o foco central de leitura se aplicará à ação e organização dos movimentos sociais, o desenvolvimento de sua luta e suas conquistas no plano político.

Bolívia, no epicentro centro da América do Sul, um levante indígena antiimperialista
A Bolívia é um país que se situa no centro do Continente Sulamenricano. Um país cheio de contrastes entre a realidade social e econômica. Pode-se afirmar que há duas Bolívias, uma das empresas transnacionais, aliadas de uma elite entreguista e outra Bolívia, de uma imensa massa de indígenas despossuídos de direitos.
A riqueza produzida naquele país se compara ao Produto Interno Bruto – PIB de estados brasileiros como o Piauí, ou Ceará. Uma pequena elite, articulada em partidos conservadores se beneficia do desmonte do estado, aplica sua política “entreguista”, enquanto milhões de bolivianos padecem na miséria absoluta, índices sociais como o de mortalidade infantil se comparam a regiões tidas pela Organização das Nações Unidas – ONU, como de “catástrofe humana”, regiões como Namíbia e Quênia na África e Haiti nas América.
Por sua imensa riqueza de hidrocarburetos, sua colocação geográfica estratégica, ou seja, sua capacidade de produzir energia para o desenvolvimento das indústrias multinacionais de todo o continente, a Bolívia desperta a atenção e o interesse de muitos “poderosos”, se colocando como fonte abundante de energia.
A década de 1990 foi para a Bolívia, assim como para todos os povos da América, a década do desenvolvimento pleno do neoliberalismo. A política do “estado mínimo”, de privatizações, de entrega do patrimônio nacional às empresas transnacionais transformou radicalmente a vida de milhões de latino-americanos. Intrinsecamente ligada a esse processo, a massa de trabalhadores expulsos do mercado de trabalho, expulsos do campo, privados de direitos básicos, aglomerados nos centros urbanos a procura de trabalho, sem uma política social condizente com a realidade da população, emerge uma nova força política em todas as partes do continente, em especial na Bolívia, os movimentos sociais de caráter antiimperialista.
Um país onde 58% da população não têm acesso aos serviços de água potável e saneamento básico, onde 44% das pessoas não têm acesso a insumos energéticos, onde 38% das pessoas não têm acesso aos serviços de saúde e que a mortalidade infantil chega a 55% (55 crianças mortas antes de completarem os cinco anos de idade a cada 1000 nascidos vivos), não poderia viver uma realidade diferente do conflito político entre os interesses nacionais, populares e os interesses transnacionais. A realidade boliviana é a realidade de todo o povo latino-americano, uma realidade dúbia, de riqueza de poucos e miséria de muitos. Como conseqüência do aprofundamento da exploração do trabalho, de exclusão social, da aplicação de uma política próxima do despotismo, o processo dialético cria as condições objetivas para uma transformação radical, na mesma proporção da radicalidade capitalista em seus objetivos imperialistas.
Os primeiros anos desse século foram de intensa agitação e organização dos movimentos sociais em toda a América Latina. O neoliberalismo aprofundou as chagas do capitalismo, sua política imperialista tem gerado, como disse Marx, os “seus próprios coveiros”. Na Venezuela, o governo nacionalista de Hugo Chaves, tendo o controle da exploração de sua maior riqueza, o petróleo, tem se constituído como uma liderança regional no enfrentamento ao capital internacional, isso com amplo apoio das camadas sociais organizadas nos círculos bolivarianos em seu país e no continente.
De Caracas, de Havana, agora de La Paz, gritos de liberdade, ações de coragem têm inspirado movimentos de todo o continente. No Equador, não podemos nos esquecer, que, há pouco tempo, o Presidente Lúcio Gutierres, eleito com uma proposta progressista, foi derrubado pelas massas populares por não cumprir seus compromissos. No Uruguai, Tabaréz Vasquez, foi eleito com propostas de mudança da política, de enfrentamento do neoliberalismo e tem acenado positivamente para uma integração regional. Na Colômbia, a guerrilha luta há mais de quatro décadas contra a opressão que vem do norte e tem alcançado grandes vitórias, nesse país as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – FARC, guerrilha marxista, controlam cerca de 40% do território nacional, construindo seu próprio sistema de governo. Na Argentina, Nestor Krischiner tem feito uma política de enfrentamento ao Fundo Monetário Internacional – FMI, à lógica neoliberal, inclusive “re-nacionalizando” os serviços saneamento de Buenos Aires. No Brasil, o governo Lula, ainda que de forma modesta, tem dado apoio a governos populares do continente, como fica claro no caso da Bolívia, quando Lula afirma que a decisão do governo boliviano é uma decisão soberana e quando coloca Chavez, em diversas ocasiões, como um companheiro.
Esse movimento tem crescido quantitativa e qualitativamente. Um Exemplo claro é o Fórum Social Mundial de Porto Alegre, o Fórum Social das Américas, a luta pela “Outra América Possível e o Fórum Continental de Luta Contra a ALCA. A organização de movimentos indígenas, trabalhadores sem terra, centrais sindicais, estudantes, intelectuais, tem avançado no sentido supranacional.
Movimentos sociais se articulam regionalmente, trocam experiências, conhecem diferentes formas de organização e luta. Nos grandes encontros o número de delegados, entidades, movimentos cresce velozmente. São diversas lutas, ligadas ao trabalho, à cultura, às questões de gênero, de educação, de meio ambiente, uma infinidade de lutas que se direcionam à crítica ao imperialismo. A questão qualitativa é elemento essencial no desenvolvimento dessas lutas. Círculos Bolivarianos, associações de moradores, sindicatos têm aumentado a discussão política entre as classes populares têm envolvido mais trabalhadores na discussão, na vida e prática política, por consciência e convicção, ou mesmo por opção única frente à dura realidade decorrente da exclusão e exploração diária.
Na Bolívia, os movimentos sociais que têm grande destaque são as organizações indígenas, como o Movimento ao Socialismo – MAS; a Confederação Sindical Única de Trabalhadores Camponeses da Bolívia – CSUTCB; Central Operária Boliviana – COB; Federação das Juntas Vecinas (associações de moradores); Coordenação de Defesa do Gás e da Água (movimentos sociais e partidos políticos nacionalistas e socialistas). Essas organizações têm tido grandes avanços nos últimos anos em sua luta pela soberania nacional e pela transformação do próprio estado.
Grandes lideranças têm despontado no cenário político boliviano, como Evo Morales, cocaleiro, líder indígena e sindical, eleito presidente no ano de 2005 com 53,7% dos votos válidos, em primeiro turno e com uma popularidade alta entre pelo menos 74% dos bolivianos. Sua história se fez num povo chamado aymará, etnia que corresponde por cerca de 25% da população do país, entre a população humilde das regiões montanhosas do país, em plantações de coca, logo Evo se tornaria grande liderança dos cocaleros de Bolívia. O grande prestígio que tem entre a população pobre do país, seu discurso abertamente antiimperialista fez com que Evo se tornasse uma figura emblemática, um deputado do Movimento Al Socialismo, com forte carisma e propostas radicais de transformação da realidade boliviana.
Felipe Quispe, da CSUTCB, também desfruta de grande popularidade e tem liderado as grandes mobilizações pela nacionalização dos recursos energéticos nesses últimos três anos. De linha mais radical, Quispe chegou a afirmar que se o governo boliviano não realizasse a nacionalização por completo das empresas transnacionais, sem indenização para as que operam ilegalmente, os trabalhadores da CSITCB realizariam manifestações de impacto até mesmo contra Evo Morales. O movimento social boliviano tem uma “organicidade” com uma cultura indígena forte, isso também contribui para o fator de identidade dos atores sociais. Tanto Quispe como Morales são indígenas e assumem sua cultura, a mesma cultura da imensa maioria de despossuídos bolivianos.
As transformações na Bolívia não podem ser compreendidas senão consideradas as grandes mobilizações populares daquele país, que nos últimos anos derrubaram dois presidentes, Gonzalo Sanches de Lozada, em outubro de 2003 e Carlos Mesa, em março de 2005. Esses presidentes, comprometidos com o programa neoliberal, efetuaram, digamos, o “leilão” da Bolívia (algo semelhante ao que FHC fez com o Brasil nos seus dois mandatos).
Gonzalo Sanches de Lozada foi afastado da presidência devido às grandes manifestações da população, em especial a de El Alto, (vizinha cidade de La Paz, marcada pela miséria e abando do estado). O povo boliviano, organizado nas centrais operárias, sob a liderança do então deputado Evo Morales, exigia a expulsão da transnacional francesa Águas de Illiami do país. Os movimentos sociais acusavam a empresa de descumprir o contrato assinado em 1997, efetuando “corte de pessoal”, má qualidade do serviço (cerca de 40 mil famílias em El Alto não têm acesso aos serviços básicos de saneamento) e aumento abusivo de tarifas.
Naquele momento, a força dos movimentos sociais aparecia de forma contundente, com o fechamento de estradas de todo o país, greve geral nos setores de saúde (o governo de Lozada retirou a estabilidade desses trabalhadores), no setor de mineração também houve paralisação total. Nos bairros, a população fechava as ruas, o transporte parou, o comércio parou, a produção parou, a Bolívia parou.
O primeiro presidente derrubado pelo povo boliviano renunciou ao seu cargo diante de intensas mobilizações populares, não resistiu à pressão da massa, deixando o país no caos social, desprestigiado até por “aliados”, se dirige a Miami, EUA, onde foi prontamente acolhido pelo governo estadunidense, fazendo jus ao tratamento que lhe era dado pelos indígenas, “gringo”. Era o início de uma nova etapa da luta dos movimentos sociais, que entraria num novo ritmo constante de conflitos e avanços no plano político. A direita boliviana tentaria se rearticular numa ampla frente de partidos conservadores, corruptos e descomprometidos com a causa nacional.
A articulação de partidos como o Movimento Nacionalista Revolucionário – MNR, o Movimento de Esquerda Revolucionário – MER e a Ação Democrática Nacionalista – ADN, mais a presença de políticos ligados a Gonzalo Sanchez de Lozada se constituiu com um objetivo comum: conter o avanço das lutas populares, organizar a reação de classe.A coalizão governamental de Carlos Mesa também buscou apoio na figura do embaixador estadunidense no país, David Greenlee, numa clara demonstração de subserviência ao imperialismo yankee. Esse grupo político se uniu em torno de um “Pacto de Unidade Nacional”.
Em resposta à magnitude da mobilização social em andamento, o governo de Carlos Mesa, que assume após renúncia de Lozada, assume com a promessa de “rever” e não romper o contrato com a empresa Águas de Illiani, mas nada faz, procura acalmar os ânimos, com promessas e amplo apoio da mídia boliviana. Esta desencadearia uma massiva campanha de “satanização” dos movimentos sociais e de suas lideranças. Os movimentos sociais, mesmo perseguidos e caluniados pelos meios de comunicação de massa, continuavam a avançar na sua luta e assustavam a elite entreguista boliviana.
Diante do impasse de Carlos Mesa, no que se refere às reivindicações dos movimentos sociais, as entidades começaram a elaborar uma pauta de reivindicações mais ampla e a pressionar pela sua aprovação por parte do governo de sua demanda. Entre as principais demandas levantadas estavam a convocatória de uma Assembléia Constituinte que fosse radical, a ponto de “refundar” a Bolívia, como afirmavam suas lideranças, inclusive Evo; A aprovação da Lei de Hidrocarburetos, com maior participação do estado e de movimentos populares na gestão da exploração do gás e de outros recursos da nação; refundação de uma empresa estatal para a exploração e administração das riquezas naturais do país, em consonância com o respeito à leis indígenas e ao meio ambiente; expulsão da empresa da cidade de El Alto Águas de Illimani, concessionária da transnacional francesa Suez; rechaço à proposta de imunidade aos soldados e cidadãos estadunidenses em solo boliviano; não negociação de acordos internacionais, como Tratado de Livre Comércio – TLC com os EUA, ou ALCA, Área de Livre Comércio das Américas até que se “refundasse” os estado; julgamento imediato de Gonzalo Sánchez de Lozada e seus apoiadores pelo massacre de 2003 e por crimes de lesa-pátria.
Mais uma vez a autoridade máxima boliviana estava sendo colocada à prova pela massa de trabalhadores indígenas, Mesa não resiste e renuncia aos seis de março de 2005, quinze meses após assumir o tão enfraquecido “poder institucional boliviano”. No lugar de Mesa, assume Eduardo Rodriguéz, que iria conduzir um momento de crise profunda do estado boliviano e de perdas estratégicas para o movimento social, principalmente para o MAS. Nas eleições distritais (municipais), o MAS alcançaria vitórias esmagadoras nas regiões mais pobres do país.
A aprovação da Lei de Hidrocarburetos e a consulta popular, através de plebiscito, foram instrumentos utilizados pelos movimentos sociais nos últimos anos. No ano de 2004, por determinação da constituição boliviana foi realizado um plebiscito nacional, onde 92% dos consultados aprovaram a nacionalização dos recursos energéticos do país. Ainda por força de lei, os movimentos sociais conseguiriam que a vontade popular manifesta nesse plebiscito se tornasse uma obrigação de qualquer que fosse o presidente que assumiria o poder em 22 de fevereiro de 2006.
Morales chegou à vitória nas eleições de 2005 com ampla margem de vantagem sobre seus adversários, com grande apoio popular e com uma expectativa de grandes transformações. Essa etapa do movimento histórico que vive a América Latina se manifesta de forma contundente na Bolívia. Os povos estão mobilizados, a Federação das Associações de Moradores da Bolívia, principalmente da região de El Alto, onde há 587 bairros, tem um poder imensurável em suas ações de bloqueios de estradas, greves gerais de setores da economia, lideranças políticas no poder, como o MAS de Evo Morales
Muitos analistas vêem na América Latina um processo histórico de grandes transformações, de desenvolvimento da consciência nacional antiimperialista e de avanços dos movimentos sociais. Sem sombra de dúvidas os movimentos sociais do continente têm assumido o papel de vanguarda na luta de classes que assume uma novo caráter histórico, de luta contra a exclusão social, contra a miséria e exploração de empresas transnacionais frente à miséria do povo. Na Bolívia, os índios têm hoje seu presidente aymará, o primeiro presidente índio em 180 anos. Esse presidente foi eleito pelas massas populares, tem popularidade a autoridade para fazer as mudanças que a Bolívia precisa. Para os povos latino-americanos, aflora a inspiração, a admiração e a luta conjunta contra o inimigo comum, a grande “ave de rapina”.
Os movimentos sociais do continente Sulamericano têm tido grandes avanços como os alcançados pelos bolivianos. Na Venezuela um processo de transformação político-social caminha a largos passos. A nacionalização das riquezas, a retomada por parte do estado do controle dos setores estratégicos de nossas economias, a reorganização dos sistemas políticos de participação e diálogo com a sociedade organizada, ou a “efetivação da democracia participativa” tem impulsionado um novo contexto político, muito mais favorável às transformações do que o vivido na década de 1990.
Por toda a América há a organização popular fazendo política e obtendo grandes conquistas, dos zapatistas no México, aos sem terra no Brasil; dos círculos bolivarianos na Venezuela, aos comitês populares de El Alto na Bolívia; dos comitês de defesa da revolução, de Cuba, aos piqueteros da Argentina; dos índios equatorianos aos camaradas da Colômbia. Vivemos um novo tempo histórico, onde a utopia não está tão longe como tentam nos fazer acreditar os pessimistas do “eterno recomeçar”. Na Bolívia o que se processa nesse momento é uma ruptura, ainda não radical, mas nesse sentido, com a lógica do mercado, portanto com os interesses imperialistas dos Estados Unidos.
Os movimentos sociais assumem a posição que mais se aproxima da posição revolucionária. Os tradicionais partidos de esquerda enfrentam crises de identidades e de práxis. Presos a concepções teóricas doutrinárias, muitas vezes perdem o trem da história. Há no continente diversos partidos políticos ditos “comunistas” compondo governos liberais, em nome de uma “condição estratégica”, enquanto os movimentos sociais estão derrubando presidentes, questionando a ordem, o próprio estado burguês.
Em todo o continente, o que se projeta é o avanço da luta popular, mesmo com a política reacionária da direita. Na Bolívia o passo fundamental foi dado, na Venezuela o processo está ainda mais avançado, a Colômbia resiste, no Brasil os camponeses avançam, os movimentos sociais são, no momento, a única força capaz de conter o neoliberalismo e propor uma nova sociedade, um “outro mundo possível”, porém a luta é constante, dialética e o caminho é repleto de espinhos, mas como diria o poeta: o passo só cansa quando não alcança a rebeldia. Diante do quadro desenhado, não resta àqueles que desejam um mundo mais justo, uma América verdadeiramente nossa, onde todos tenha dignidade, só resta exaltar a rebeldia, viva a Bolívia rebelde, o Movimento Al Socialismo, viva a força indestrutível dos trabalhadores. Viva nuestra América!