quinta-feira, 24 de março de 2016

Abre a porta, Mariquinha! Ou te quebro no pau de macarrão


Abre a porta, Mariquinha! Eu não abro não!

("A resposta de Mariquinha", ou a razão da Maria da Penha?)

A resposta de Mariquinha é uma música que marcou os anos 1990 na voz da dupla infantil da época Sandy e Júnior, filhos dos milionários cantores sertanejos Chitãozinho e Xororó.

Inocentemente milhões de crianças cresceram cantando essa música. Lembro-me das apresentações nas escolas, o sucesso nos programas de TV. Realmente a música embalou multidões de crianças. Era tudo muito "bunitinho".

Esses dias ouvi essa música que fez parte da infância de muitos adultos de hoje e após uma conversa com uma militante feminista comecei a analisar a letra da música e fiquei estarrecido, "de cara" com o quanto ela é machista. Trata-se de uma declaração de "réu confesso" a ser entregue às autoridades.

O marido de Mariquinha chega à sua casa quando o dia está amanhecendo, voltado da "pagodeira". Provavelmente está embriagado. Bate à porta, mas Mariquinha resiste e não quer abrir. Teria medo Mariquinha? O que diz a letra:

"Oh! Mariquinha, abre a porta e não reclama
Mostra que você me ama, que eu não quero discussão
Você queria que seu bem fosse bocó
Pra te levar no forró
E depois ficar na mão".

Como assim, "abre a porta e não reclama", "você queria que seu marido fosse bocó"? O marido de Mariquinha dá uma ordem à sua esposa e ainda diz que ele, na condição de homem, pode sim ir ao forró sem a sua companhia, pois não queria "ficar na mão".

"Mariquinha eu tô ficando nervoso
E quando eu fico nervoso
Pra mim meia dúzia é seis, abre a porta!".

Aqui tipifica-se o crime de ameaça. O machismo do marido de Mariquinha fica explícito e sua ameaça é prova contundente de que a violência física é eminente.

"Oh! Mariquinha, não levei você comigo
Tive medo do perigo, desse tal de Ricardão
Fui no forró, mas agora tô de volta
Venha já abrir a porta
Que eu não durmo fora não".

Mariquinha ainda ouve de seu marido que o tal do "Ricardão" é uma ameaça à "moral do macho", mas esse mesmo "macho" se acha no direito de paquerar outras mulheres.

O marido de Mariquinha afirma que sua esposa não pode reclamar, deve se calar, ser submissa e faz agora uma ameaça de derrubar a porta e agredí-la com o pau de macarrão:

"Eu já falei que não vou abrir a porta
E peço que você volte sem fazer reclamação
Se eu abrir, já sei o que vou fazer
Você vai ter que gemer
É no pau-de-macarrão".

Como uma música aparentemente "inocente" cantada por milhões de crianças trata naturalmente a violência contra a mulher dessa forma?

Confesso que nunca havia pensado nessa letra, me lembro que a música pra mim era sobre um marido sem vergonha e uma esposinha que não queria abrir a porta, só isso.

Hoje imagino que Mariquinha devia tremer atrás da porta temendo a violência do marido embriagado. Mariquinha já convivia com as ameaças e sabia do marido que tinha, machista, violento. Mariquinha vivia sob ameaças, era reprimida, não tinha liberdade e, por vezes, apanhava de pau.

Horrível! Maria da Penha para esse "macho ferido".

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